quarta-feira, 19 de novembro de 2014

Crítica: Jogos Vorazes: A Esperança - Parte 1

Título original: The Hunger Games: Mockingjay - Part 1
Direção: Francis Lawrence


Cotação: 4/5


Eles costumavam gritar meu nome. Agora o sussurram.

Os versos da cantora Lorde que acompanham os créditos de Jogos Vorazes: A Esperança – Parte 1 dizem muito mais do que aparentam. Fazendo coro a uma frase dita pelo extravagante Ceasar (“A Capital a amava. Todos aqui adoravam a menina.”), percebemos que a primeira parte do final da história de Panem é um longa muito mais político do que seus antecessores. Esse fator, outrora rascunhado, finalmente ganha contornos mais definidos e trocando a ação por um intenso e angustiante jogo psicológico, a saga da garota em chamas atinge seu ápice e prepara o terreno para um grand finale que promete ser destruidor.

Esqueça as cores. Com um tom muito mais cinzento do que até então, Francis Lawrence (retornando depois do excelente trabalho em Jogos Vorazes: Em Chamas) sabe pesar a mão quando necessário e dar a suavidade nos momentos em que esta grita para existir. A quase ausência de vida do filme neste sentido é um retrato perfeito do que seus personagens passam: A angústia, o medo, a incerteza. A tão falada esperança, reforçada no título, é tão frágil quanto a atual situação nos distritos.

O estado de Katniss Everdeen, então, é a personificação deste misto de sentimentos. Já na primeira cena, somos jogados na mente da personagem e percebemos o quanto os jogos a mudaram – fato reforçado minutos depois numa fala de Alma Coin (Julianne Moore, em uma adição maravilhosa). Agarrando com unhas e dentes sua heroína, Jennifer Lawrence constrói seu melhor momento na saga até aqui, usando todas as chances que tem de brilhar (e elas são muitas, dado os muitos closes que Lawrence – diretor – escolhe usar, guardando as sequências abertas para poucos momentos).

O desespero de Katniss pode ser sentido em vários momentos durante as mais de 2 horas de filme e, muitas vezes, está em expressões. No modo de sussurrar o nome de Peeta (Josh Hutcherson), no olhar perdido procurando por um apoio, no cuidado ao andar até um hospital de feridos de guerra. Na raiva que extravasa. No medo que deixa transparecer. Na fragilidade que, aqui, está mais uma vez disfarçada pela casca dura – e por um traje de Tordo, papel que, relutantemente, a garota finalmente assume.

Hutcherson, inclusive, também consegue aqui seu melhor momento na série (e na carreira). Mesmo sem muitos momentos de tela, o ator (aliado a um excelente trabalho de maquiagem) mostra a mudança de Peeta ao longo do filme  de maneira impecável e, no momento em que isso atinge o clímax, somos presenteados com uma das sequências mais angustiantes da franquia. Liam Hemwsorth, a outra ponta do triângulo com Katniss, faz de seu Gale um personagem muito melhor e mais suportável, ajudado tanto pelo maior tempo em cena quanto pelos momentos em que o personagem mostra que é mais do que apenas um rostinho bonito.

O resto do elenco, à exceção de Phillip Seymour Hoffman, que assume um papel de líder político importante, aparece em momentos esparsos, mas consegue se firmar. Sam Claflin traz a tona o lado mais perturbado de Finnick (e, vale ressaltar, protagoniza uma das sequências mais angustiantes do longa), Elizabeth Banks e Woody Harrelson são o alívio cômico necessário e mesmo as estreantes Natalie Dormer e Juliane Moore brilham quando lhes é dada a chance – à segunda muito mais do que a primeira, é justo dizer.

E é exatamente em Plutarch Heavesbeen e seu jogo midiático que reside uma das belezas do longa (e da saga): Sua afiada crítica comunicacional. Toda a opressão em Panem foi construída por Snow (Sutherland volta matador, aliás) graças ao poder da mídia e é de uma belíssima ironia que seja esta a arma usada pelas forças rebeldes. As peças de TV, a construção da figura do Tordo, a tentativa de moldar Katniss perante as câmeras e Panem e todo o aparato de roteiro escrito para a personagem solidificam a reflexão, começada lá no primeiro filme, quando Katniss e Peeta forjam seu romance para conquistar o povo de Panem.

Claustrofóbico e intenso, Jogos Vorazes: A Esperança – Parte 1 é, assim, um ótimo ponto de partida para a conclusão da história da garota em chamas. Com sequências por vezes angustiantes e abandonando de uma vez qualquer vestígio de trama adolescente, o longa firma-se como mais um acerto da franquia que, ano que vem, chega ao fim. Esperamos, então, que em 2015, Katniss consiga libertar Panem da opressão que lhe foi colocada e que a esperança triunfe. E é esta a lição que este filme deixa: Mesmo em meio ao dia mais cinza e a batalha mais difícil, há sempre tempo para uma canção e um revigorar de forças. Há sempre tempo para esperança.

Katniss demorou, mas parece finalmente caminhar para entender isso. Nós também. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário